Por Tatiana Pereira Tonet - Toledo-PR
Quando eu tinha meus treze anos eu estava na sétima série, em uma escola chamada Álvares de Azevedo, na cidade de Vilhena, Rondônia.
Nessa época, eu era uma menina magra e baixa – franzina – e o desenvolvimento da minha puberdade foi tardio, assim como ocorreu com minha mãe. Somente aconteceu por volta dos meus quinze anos.
O que era perceptível na época, era o fato de eu estar menor do que as outras meninas da minha turma. Elas, aos treze anos, já eram bem mais altas do que eu e, ainda, bem mais desenvolvidas fisicamente.
Como eu vivia na piscina, nos rios e andando de bicicleta pelo sol de Rondônia, meu apelido em casa era ‘Neguinha’ e ‘Índia’, não só porque eu tinha a pele bronzeada, mas também porque meus cabelos eram negros, lisos e cortados bem retos, inclusive a franja, características que, de fato, lembravam uma índia. Já o apelido de neguinha foi dado porque eu era, entre todos os meus irmãos, a mais morena.
Eu era tão parecida com uma índia, que os professores da escola sempre me chamavam para recitar poemas no ‘Dia do Índio’ ou participar de uma dança específica. Algo que eu fazia com gosto, tanto é que, com a ajuda da minha mãe, eu confeccionava minhas próprias roupas indígenas para a apresentação.
Lembro-me, claramente, como se fosse hoje, uma professora de outra turma dizendo: —Nossa! Ela parece uma índia mesmo!
Até esse momento, na minha infância, sentia-me feliz com os meus apelidos, não me incomodava nem um pouco com eles.
O problema foi naquele fatídico ano da sétima série. Como eu era a menor da turma, um menino, que estudava comigo desde a quinta série, chamado Daguimar – de pele bem branca, cabelos amarelos e olhos claros – começou a me chamar de "Chihuahua". Sim, isso mesmo! Um nome de um cachorro pequeno e magricelo.
Foi nesse momento que tudo mudou, comecei a me achar feia e a impressão que eu tinha é de que nunca fosse crescer na vida. Controlava o meu crescimento, semanalmente, na parede de casa, fazendo aqueles famosos traços com o lápis ou com a caneta para observar o meu crescimento, e os resultados não eram nada satisfatórios nessa época.
Na escola, bastava tocar o alarme do recreio e lá estava o Daguimar me chamando de Chihuahua.
Lembro-me que me sentia muito mal. Sentia muita raiva.
Quanto mais eu odiava esse apelido, mas este moleque dos infernos me chamava de Chihuahua. Na entrada e na saída da escola era a mesma coisa, ele me via e já me chamava pelo apelido. E, assim, foi o ano todo…
No ano seguinte, na oitava série, eu continuava baixinha, todos estavam mais crescidos, menos eu.
Que ódio! E, como sempre, lá estava o Daguimar me chamando de Chihuahua. Eu o xingava e nada de parar com o apelido.
Após muitas orações para que esse menino sumisse da face da terra, em um dia qualquer, na biblioteca da escola, procurando um livro para levar para minha casa e ler, eu encontrei a solução dos meus problemas: uma obra chamada de 'DANGUIMAR – O EXTRATERRESTRE'. Pronto!
Além do nome ser similar, o extraterrestre era branquinho igual ao menino dos meus tormentos.
Lembro-me, como se fosse hoje, da ilustração da capa do livro: o extraterrestre tinha orelhas que lembravam um saxofone, olhos verdes e arregalados e um sorriso simpático.
Imaginei: — que sorte ter encontrado este livro! Era tudo o que eu precisava.
Peguei o livro, cheguei na sala e coloquei na carteira dele.
— Daguimar, olha você ai!
E eu comecei: — DANGUIMAR, O EXTRATERRESTRE!
O menino ficou vermelho, nervoso, perdeu as palavras e se sentiu extremamente constrangido.
Detalhe: fiz isso na frente de todos os colegas da sala, assim como ele fazia comigo. Não me senti satisfeita e continuei…
Fiquei repetindo isso por um bom tempo, assim como ele havia feito comigo. Falava na entrada da escola, na saída, na hora do intervalo, ou seja, toda vez que não via um adulto, que pudesse me recriminar ou me levar para a coordenação. De oprimida, tornei-me opressora!
Por fim, o apelido de Chihuahua cessou. Também cansei de chamá-lo de Danguimar, o extraterrestre. Por incrível que pareça, a vingança também cansa!
Ao término do ano, fui morar em Curitiba, fazer meu ensino médio, e foi quando o milagre da vida aconteceu. Antes, minha altura não passava de 1,47 m e, com a puberdade, saltei para 1,62 m. Quanta alegria! Isso tudo aconteceu em apenas um ano e meio.
Por fim, estava alta e voltei a me sentir feliz com o meu corpo e com a minha aparência. Algo que nunca havia me incomodado até o fatídico dia que eu ganhei aquele apelido.
Hoje, percebo que somente nos sentimos mal porque alguém nos aponta um defeito. Eu teria passado pelas séries finais do ensino fundamental sem percalços, mas não! Sempre há alguém que nos aponta uma limitação, um constrangimento, e isso, na cabeça de uma criança, é uma tempestade de emoções e traumas.
Naqueles anos presenciei outras histórias de bullying com amigas da escola, mas irei contá-las em um outro momento.
O que importa é que hoje me sinto feliz com o meu corpo, com a minha altura e com a minha idade. Estou viva! É o que realmente importa. E ninguém neste mundo irá me fazer sentir mal novamente.
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